Num mundo que pode ser lido você com certeza estará
preso entre parênteses.
Já se passaram algumas primaveras sem folhas
desde que retirei da parede da sala na casinha de campo ao lado daquele mega
centro comercial todos os nossos retratos, mas não tive coragem de me desfazer
dos outros guardados na gaveta da mesinha torta de canto depois de tê-los
retirado da parede. A verdade é que nessa casa eu só tenho cacarecos e ai vão
trocentos broches de ágata que colecionava, louças empoeiradas, móveis em
desuso que pra ser sincera nem mesmo usei- eram da minha vó- acordeões e violas
do meu pai e mais uma orquestra de velharias metálicas que vivem esperando um
passo em falso meu para entoarem pavonadas estrondosas.
Partido em pedaços uma vez o coração pode ser
partido tantas outras e cada amor que passa vai levando o seu.
Sim, a saber, da primavera sem folhas já ia me
esquecendo de contar que dei uma repaginada naquele nosso jardim que de última
hora consegui lhe convencer a não cultivar rosas em razão desse nosso clima tão
inferno brasileiro, se bem que, insisti tanto para irmos morar na argentina mas
esse futebol lhe roeu os miolos. Gritei as mil diagonais do mundo que não tenho
nada contra argentinos!
As lágrimas degradaram o degradê que distinguia
os dias comedidamente bons dos dias pavorosamente apáticos.
Quando sua mãe ria ao me
contar de suas malcriações de criancinha mimada que ela resoluta negava ter
mimado eu me divertia e ria, afinal, eram somente malcriações de criancinha
mimada e jamais imaginei que você as levaria para a fase adulta ao ponto de
fazer birra quando mencionei a possibilidade de morarmos na argentina, mas tudo
bem você já se foi e o peso argentino só achou de nos ser favorável agora, que
por falar em peso, olha que carrega minha consciência algumas toneladas de
arrependimento porque eu era moça de família rica e meu pai não era de cultura
patriarcal machista. Poderia ter ido sozinha. Viveria num lugar em que se pode cultivar
rosas e que nem todo mundo é fã do Pelé, ora e veja...
- Vó. Ei! Chá?
Não sou como as mocinhas delicadas que tomavam
chá a tardinha, aliás eu já sou velha e gosto mesmo é de um café preto.